quinta-feira, 31 de março de 2011

Quaresma: Vais faltar a um jantar romântico?

«Diz agora o Senhor: «Convertei-vos a Mim de todo o coração, com jejuns, lágrimas e lamentações. Rasgai o vosso coração e não os vossos vestidos. Convertei-vos ao Senhor, vosso Deus, porque Ele é clemente e compassivo, paciente e misericordioso, pronto a desistir dos castigos que promete. Quem sabe se Ele não vai reconsiderar e desistir deles, deixando atrás de Si uma bênção, para oferenda e libação ao Senhor, vosso Deus? Tocai a trombeta em Sião, ordenai um jejum, proclamai uma reunião sagrada. Reuni o povo, convocai a assembleia, congregai os anciãos, reuni os jovens e as crianças. Saia o esposo do seu aposento e a esposa do seu tálamo. Entre o vestíbulo e o altar, chorem os sacerdotes, ministros do Senhor, dizendo: ‘Perdoai, Senhor, perdoai ao vosso povo e não entregueis a vossa herança à ignomínia e ao escárnio das nações. Porque diriam entre os povos: Onde está o seu Deus?’». O Senhor encheu-Se de zelo pela sua terra e teve compaixão do seu povo.»
(Joel 2, 12-18)


Começamos o tempo litúrgico da Quaresma que coloca o acento e nos coloca a nós naquilo que é essencial: colocar o nosso coração em Deus, que nos chama para um belo jantar romântico de 40 dias.
A Quaresma surge como uma oportunidade dada por Deus, como graça, para fazermos caminho, a fim de não nos acomodarmos às nossas coisas, aos nossos umbigos, às nossas vidas.
É, por isso mesmo, tempo de deixar de lado o egoísmo e tempo para passarmos a ser mais teocêntricos e mais cristocêntricos.
Além disso, a Quaresma é possibilidade de nos recentrarmos. Pela voz do profeta Joel, com recurso a uma linguagem directa e incisiva – usando nada mais nade menos 12 verbos no imperativo – Deus diz agora – que é hoje – a todos nós: “Convertei-vos a Mim de todo o coração” e ainda “Rasgai os vossos corações”.

Com a devida vénia ao autor (que não consigo precisar) partilho um texto que encontrei num blogue e que ajuda a olhar de um modo diferente e belo este tempo favorável que nos é dado de graça e como graça.

Há dias, num programa de televisão, determinada figura pública, questionada sobre as discotecas, respondia que não gostava e não frequentava pois, mesmo que falassem aos gritos não conseguia ouvir, nem fazer-se ouvir. Além do mais, quando tinha coisas importantes para dizer, procurava lugares tranquilos, serenos e silenciosos. Nomeadamente, quando quer dizer à sua esposa que a ama, convida-a para um jantar romântico, pois em ambiente sereno e tranquilo, consegue ouvir e fazer-se ouvir.

Entendi, de imediato, a razão de ser da Quaresma: 40 Dias de Jantar Romântico. Deus quer dizer-nos que nos ama, pois “É Amor” (cf. 1 Jo 4, 8), quer convidar-nos a ser “Seus imitadores” (cf. Filip 3, 17), pois somos criados à sua imagem e semelhança (cfr. Génesis 1, 26 ss), o mesmo é dizer que nos criou com uma capacidade infinita de amar. Porque nos quer dizer isto, chama-nos à serenidade e sobriedade da Quaresma, pois só assim se consegue fazer ouvir. Na correria e na lufa-lufa do dia-a-dia, Ele tenta fazer-se presente e audível, chega mesmo a gritar, mas… não se consegue fazer ouvir, porque andamos distraídos, ocupados, descentrados, dispersos… por isso, nos convida à Quaresma. Convida-nos, ao jejum, à oração e à esmola. Convida-nos a entrar dentro de nós para O encontrar, pois: “«Se alguém me tem amor, há-de guardar a minha palavra; e o meu Pai o amará, Nós viremos a ele e nele faremos a nossa morada»” (Jo 14, 23).

Para que tal suceda: menos diversão, menos barulho, menos televisão, menos internet, menos café, menos tabaco, menos alimento… mais silêncio, mais oração, mais escuta e meditação da Palavra de Deus, mais generosidade, mais atenção ao próximo, mais perdão… mais encontro com Deus: “Permanecendo simples e amorosamente na Sua presença para que possa reflectir em nós a Sua própria imagem como se reflecte o sol no límpido cristal” (Beata Isabel da Santíssima Trindade).

Para que seja possível escutá-l’O: "É assim que a vou seduzir: ao deserto a conduzirei, para lhe falar ao coração" (Os 2, 16), identificá-l’O e encontrá-l’O: “Sempre que fizestes isto a um dos meus irmãos mais pequenos, a mim mesmo o fizestes” (Mt 25, 40), é fundamental que, na nossa vida, de discípulos, aconteça este anual Jantar Romântico de 40 dias, que desagua na nascente da Vida Nova, na festa da Vida Nova, na PÁSCOA. Em que poderemos cantar, com a vida, o Hino da alegria de nos encontrarmos mais parecidos com Cristo, que imprime em nós, ao longo deste “Jantar Romântico de 40 dias”, a Sua imagem: “Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim” (Gl 2, 20).

Rezo por todos para que aproveitemos este banquete gratuito,
este belo jantar romântico:
Ó Deus Pai
Damos-Te graças
Porque nestes dias da Quaresma
És grande e amoroso connosco.

Chamas-nos para que reconheçamos a nossa realidade
E voltemos o nosso coração para Ti.

Confessamos que, como crianças,
Queremos viver de desejos à nossa medida.

Tu, ó Deus de bondade e compaixão,
Gritas e vens ao nosso encontro
Para mudarmos o rumo.

Damos-Te graças
Porque caminhas connosco
Neste tempo de Quaresma
Rumo à Páscoa do Teu Filho.
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sábado, 26 de março de 2011

Marinho e Pinto agradece o papel dos cristãos


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Artesão do armamento

producao ilegal de armas nas filipinas 009 Produção ilegal de armas nas Filipinas

Não sou eu quem determina o destino do mundo.
Não sou eu quem começa as guerras.

Apenas sigo o meu caminho. Faço o meu trabalho.
Nada faço de errado.
Mas não sei.

E essa é a questão,
que sempre me atormenta.
Não quem determina,
e no entanto nada faço de mal.

Faço girar parafusos pequeninos com os meus dedos,
fabricando componentes de armas
que nos ameaçam a todos.
E ainda assim não sou eu quem determina
o destino que aparece diante de nós.

Eu poderia criar outro destino,
tornando o mundo seguro para todos aqueles
que anseiam viver a sua vida.

E então eu saberia
a razão sagrada,
o significado brilhante
da nossa existência.

Ninguém então poderia destruir-nos
com as suas acções
ou iludir-nos
com as suas palavras.

O mundo que eu ajudo a fazer
não é um mundo bom.
No entanto eu não sou mau.
E não fui eu que o inventei.
Mas será isso suficiente?

João Paulo II
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sexta-feira, 25 de março de 2011

Anunciação



"Porque em tudo semelhante
Ele a eles se faria
E viria ter com eles,
E com eles moraria...


Por isso com orações,
Com suspiros e agonia,
Com lágrimas e com gemidos
Lhe rogavam noite e dia...

Uns diziam: Oh! Se fosse
No meu tempo essa alegria!;
Outros: Acaba, Senhor,
Ao que hás-de enviar, envia;
Outros: Oh! Se já rompesses
Esses céus, eu já veria
Com meus olhos que descesses,
E meu pranto cessaria!
Regai, ó nuvens do alto,
Porque a terra te pedia,
E abra-se já a terra
Que espinhos nos produzia,
E produz aquela flor
Com que ele floresceria.

Outros diziam: Oh! Ditoso
Quem em tal tempo vivia,
Que mereça ver a Deus
Com os olhos que possuía,
Tratá-lo com suas mãos,
Estar em sua companhia,
E desfrutar os mistérios
Que ele então ordenaria!

Em estes e outros rogos
Muito tempo passaria;
Porém nos últimos anos
O fervor muito crescia...

Então chamou um Arcanjo,
Que São Gabriel se dizia,
Enviou-o a uma donzela
Que se chamava Maria,
De cujo consentimento
O mistério dependia;
Na qual a Santa Trindade
De carne ao Verbo vestia;

E, embora dos Três a obra,
Somente num se fazia;
Ficou o Verbo encarnado
Nas entranhas de Maria.

E o que então só tinha Padre,
Já Madre também teria,
Embora não como outra
Que de varão concebia,
Porque das entranhas dela
Sua carne recebia;
Pelo qual Filho de Deus
E do Homem se dizia."

São João da Cruz
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quinta-feira, 24 de março de 2011

A mulher invisível

A alegria de ser-se



Sabemos como é essencial a alegria da vida: não é só um remédio que cura, é também o melhor caminho para a relação com Deus. De onde nasce este sentimento estimulante que é a alegria da vida?

Não vem da fortuna e da auto-satisfação e, muitas vezes, surge nas mais graves dificuldades e perseguições. Em tempo de tensão, a alegria é especialmente valiosa e curativa.

Chamemos-lhe a alegria de ser-se. Ela não tem razões terrenas. Chega como precursora das mais altas correntes para espiritualizar toda a atmosfera envolvente. Poderá haver sentimentos de alegria quando se está aflito com a doença ou a morte, ou quando se é vítima de injustiça ou de insultos?

Sim, mesmo em tais circunstâncias, os olhos podem encher-se de fogo. A cabeça caída, pode erguer-se e experimentar uma força nova.

Então, começaremos a regozijarmo-nos com a vida, talvez não já com a nossa vida, mas com o ser-se. A atmosfera à nosso volta será purificada. Os que se aproximarem sentirão alívio pois cada preservação de energia é benevolente.

Todos os que procuram deveriam lembrar-se da alegria da vida.

Não é preciso encontrar razões científicas especiais para tal alegria. Ela chega através do coração e é absolutamente real.

Por vezes, Cristo reunia os seus discípulos para um festival de alegria. Apenas eram servidos água e pão, e o Senhor dizia: "Não vamos sujar a nossa alegria com alimentos ricos, a alegria está acima de tudo."
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quarta-feira, 23 de março de 2011

Duelo de banjos



O filme "Amargo Pesadelo" estava a ser rodado no interior dos Estados Unidos. O director fez uma paragem num posto de gasolina nos confins do mundo, onde aconteceria uma cena entre vários actores contracenando com o proprietário do posto onde ele também morava com sua mulher e filho. Este último, autista, nunca saia do terreno da casa. A equipa parou no posto de gasolina para abastecer e aconteceu a cena mais marcante que o director teve a felicidade de encaixar no filme.

Num dos cortes para refazer a cena do abastecimento, um dos actores que sendo músico andava sempre acompanhado do seu instrumento de cordas aproveitando o intervalo da gravação e já tendo percebido a
presença de um garoto que dedilhava um banjo na varanda da casa aproximou-se e começou a repetir a sequência musical do garoto.

Como houve uma 'resposta musical" por parte do garoto, o director captou a importância da cena e mandou filmar. O resto pode-se ver no vídeo.

Atentem para alguns detalhes:
- O garoto é verdadeiramente um autista;
- Ele não estava nos planos do filme;
- A alegria do pai curtindo o duelo dos banjos... dançando;
- A felicidade da mãe captada numa janela da casa; e
- A reacção autêntica de um autista quando o actor músico quer
cumprimentá-lo.

Vale a pena o duelo, a beleza do momento e, mais que tudo, a alegria do garoto. A sua expressão. No início está distante, mas, à medida que toca o seu banjo, ele cresce com a música e vai deixando-se levar por ela, até
transformar a sua expressão num sorriso contagiante, transmitindo a todos a sua alegria. A alegria de um autista, que é resgatada por alguns momentos, graças a um violão forasteiro. O garoto brilha, cresce e exibe o sorriso preso nas dobras da sua deficiência, que a magia da música traz à superfície. Depois, ele volta para dentro de si, deixando a sua parcela de beleza eternizada "por acaso" no filme "Amargo Pesadelo" (Ano: 1972).
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terça-feira, 22 de março de 2011

Eu, padre, casado me confesso…


Anda por aí um burburinho dos diabos, à conta de uma declaração de uma centena e meia de teólogos alemães que, há falta de um tema mais original, decidiram questionar o celibato sacerdotal. É, juntamente com o famigerado sacerdócio feminino, uma insistente proposta de alguns grupos de católicos pouco ortodoxos que, se me permitem a charada ecuménica, de tão reivindicativos dir-se-ia que são protestantes.

Não obstante alguns contornos mais caricatos, a questão é séria e merece alguma reflexão. Depois de uma etapa fundacional em que, à imagem de Cristo, os apóstolos e outros, como São Paulo, se mantiveram célibes “pelo reino dos Céus”, vieram tempos em que os presbíteros podiam ser casados. Contudo, tendo em conta os resultados dessa primitiva experiência, entendeu-se preferível retomar a tradição evangélica, repondo o celibato sacerdotal na Igreja Católica latina. Portanto, um eventual regresso à anterior situação representaria, em termos históricos, um retrocesso, ainda que disfarçado de revolucionária novidade e, o que é pior, um afastamento em relação ao exemplo de Cristo, que é o modelo e a razão do sacerdócio eclesial.
Há, sobre esta matéria, um duplo equívoco, que importa esclarecer.

O primeiro decorre da suposição de que só há amor quando há uma vida sexual activa e, portanto, a imposição do celibato implica a frustração emocional do padre que, entregue à sua própria solidão, fica assim mais exposto às fraquezas da humana condição. Já São Paulo advertira: mais vale casar-se do que abrasar-se. É certo. Porém, o sacerdote não é um homem sem amor, muito embora a sua realização afectiva não tenha expressão sexual. Um presbítero que não ame, que não esteja apaixonado, é certamente um ser vulnerável e fragilizado, não por ser padre, mas precisamente por o não saber ser.

Com efeito, o ministério sacerdotal não se reduz a uma função burocrática, em cujo caso o celibato não faria sentido, mas antes se realiza naquele “amor maior” de que Jesus Cristo é o perfeito exemplo. E é bom recordar que o Verbo encarnado não é apenas Deus perfeito, mas também perfeito homem, pelo que a sua circunstância celibatária não só não foi óbice como condição para essa plena realização da sua natureza humana.

Outro lapso é supor que os padres da Igreja Católica são solteiros, o que manifestamente não corresponde à realidade. Saulo de Tarso, quando disserta sobre a grandeza do sacramento do matrimónio, refere-o a Cristo e à sua Igreja, por entender que esta aliança é de natureza nupcial. Por isso, o sacerdote católico, configurado com Cristo pela graça da sua ordenação, “casa” com a Igreja, que é a sua esposa, não apenas mística mas também real e existencial, na medida em que lhe exige uma entrega exclusiva e total.

Há tempos ouvi na rádio uma conhecida balada, em que se repetia um refrão que é aplicável ao celibato sacerdotal: “eu não sou de ninguém, eu sou de todo o mundo e todo o mundo me quer bem”. Nem mais: para ser de todos e para todos é preciso não ser de ninguém em particular. É o que também me dizia um amigo quando, dando-me as Boas Festas, desejava felicidades para a minha família que, acrescentava com inspirada eloquência, “somos todos nós”.

Mas há mais. Os inimigos do celibato sacerdotal obrigatório são muito mais generosos do que se pensa pois, não satisfeitos com dar uma mulher aos padres, querem dar-lhes duas: a esposa e … a sogra!


P. Gonçalo Portocarrero de Almada
Voz da Verdade, 2011-03-20
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segunda-feira, 21 de março de 2011

Eu sou um projecto inacabado



A verdade é que não consigo acrescentar minutos à minha existência, não estou feito ou acabado... por vezes, desejo saltar no tempo, sair do presente o mais depressa possível, como que colocando uma borracha sobre aquilo que verdadeiramente sou. A tristeza, que me leva a essa pretensão, é o SENTIMENTO CERTO, não devo temer senti-la, representa o verdadeiro amor que coloco na minha história. Seria estranho se assim não fosse.

E porque não existe uma empresa que recicle o meu pensamento, o meu imaginário e o meu ranking, que defini inconsequentemente ao longo da vida, apenas cabe-me a tarefa mais difícil mas, certamente a melhor, de procurar dentro de mim a liberdade, no TEMPO, do caminho que em verdade continuarei a prosseguir, evolutivamente, porque esta minha história não termina aqui.

Saiba, em discernimento, não procurar a felicidade do pão ou da Coca-Cola. A felicidade do pão encontro-a na padaria ao lado de minha casa e a felicidade da Coca-Cola encontro-a na primeira máquina de bebidas que cruzo no trilho que estou habituado a percorrer, sem esforço, simples e efémera...

Deste modo saiba, em discernimento, procurar a FELICIDADE DA LIBERDADE, no TEMPO, com tremenda gratidão perante o projecto inacabado que sou, que ainda, e sempre, posso transformar, direccionar, reencaminhar para a liberdade do amor porque, posso dar sempre, mas sempre, alguma coisa de mim... e, ai, residirá minha ALEGRIA.

QUE QUEM PASSE NA MINHA VIDA NUNCA PARTA IGUAL e se reveja, neste projecto
inacabado que tem em suas mãos, bem dentro de si.
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domingo, 20 de março de 2011

A primavera está por toda a parte.



A primavera está por toda a parte. Até em nós?

A primavera está por toda a parte. Em nosso redor a natureza parece vencer a imobilidade do inverno e amontoa os traços insinuantes do seu reflorir. Há uma seiva que revitaliza a paisagem do mundo. Mesmo nos baldios, nos pátios e quintais abandonados, nos jardins mais desprovidos a primavera desponta com uma energia que arrebata. Penso muitas vezes nos versos do Cântico dos Cânticos, o mais primaveril poema da Bíblia: «Fala o meu amado e diz-me: “Levanta-te! Anda, vem daí, ó minha bela amada! Eis que o inverno já passou, a chuva parou e foi-se embora; despontam as flores na terra, chegou o tempo das canções, e a voz da rola já se ouve na nossa terra; a figueira faz brotar os seus figos e as vinhas floridas exalam perfume. Levanta-te! Anda, vem daí, ó minha bela amada! Minha pomba, nas fendas do rochedo, no escondido dos penhascos: deixa-me ver o teu rosto, deixa-me ouvir a tua voz; pois a tua voz é doce e o teu rosto, encantador”» (Ct 2, 10-14). Neste poema, a primavera do mundo é uma representação simbólica da primavera interior que nos desafia. Na verdade, o nosso coração não pode continuar eternamente sequestrado pelos impasses dos seus invernos gelados. A nossa vida está prometida à primavera – é a mensagem que o despertar da natureza (e aquele mais íntimo) nos parece segredar.

Mas também acontece que o renascimento do mundo nos parece incomparavelmente mais simples que o nosso. Por nossa parte, sentimo-nos soterrados e sem forças. Achamos que já passou demasiado tempo, que em algum momento do percurso nos perdemos e que talvez isso seja agora irremediável. Vamo-nos deixando ficar num conformismo tácito, insatisfeitos e adiados, a ponto de desistir. Certamente a voz da primavera não nos deixa indiferentes: ela há de sempre sobressaltar-nos. Mas olhamos para ela com mais nostalgia do que com esperança. Contemplámo-la à distância. Ou então defendemo-nos dela como podemos, fingindo não perceber o que significa. No fundo de nós mesmos, consideramos que a primavera já não é para nós. E no nosso coração andamos às voltas com aquela pergunta que também a Bíblia conserva e que não temos paz enquanto não conseguirmos responder: «Pode um homem, sendo velho, nascer de novo?» (Jo 3,4).

Os cristãos começam por estes dias um tempo litúrgico que é uma espécie de pronto-socorro da primavera. Falo da quaresma. Gosto de explicá-la a mim mesmo como um curso intensivo de jardinagem, pois trata-se de revitalizar a paisagem da vida, projetando-a dinamicamente, devolvendo-lhe intensidade e cor. A quaresma aprofunda três sulcos, afinal muito simples (o da oração, o da esmola e o da renúncia a que chamamos jejum), mas pode constituir uma alavanca de transformação que restaura em nós a liberdade de ser, que cimenta a capacidade de reconstruir a vida e de a viver fraternalmente, que nos dá um sentido de confiança capaz de abraçar criativa e serenamente a própria fragilidade, que melhora o nosso ânimo e até o nosso humor. Fazemos Quaresma para arriscar a Páscoa.

José Tolentino Mendonça
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sábado, 12 de março de 2011

Testamento espiritual de Shahbaz Bhatt



O legado espiritual de Shahbaz Bhatti, ministro cristão do Pakistão, assassinado a 2 de Março de 2011

Chamo-me Shahbaz Bhatti. Nasci numa família católica. O meu pai era um professor reformado e minha mãe uma dona de casa, educaram-me de acordo com os valores cristãos e os ensinamentos da Bíblia. Estas duas coisas tiveram uma grande influência na minha infância.

Desde criança que costumava ir à igreja e aí encontrava profunda inspiração nos ensinamentos, no sacrifício e na crucifixão de Jesus. Foi o amor de Jesus Cristo que me levou a oferecer os meus serviços à igreja. As terríveis condições em que viviam os cristão do Pakistão causaram um grande impacto em mim.

Lembro-me de uma sexta-feira Santa, quando tinha 13 anos, em que ouvi um sermão sobre o sacrifício de Jesus para nossa redenção e salvação do mundo. Pensei que devia corresponder a esse amor, amando os meus irmão e irmãs, pondo-me ao serviço dos cristãos, especialmente dos pobres, dos necessitados e dos perseguidos que vivem neste país islâmico.

Pediram-me que ponha fim à minha luta, mas sempre me neguei, ainda que com risco da minha vida. Minha resposta foi sempre a mesma. Não procuro popularidade nem posição de poder. Procuro somente um lugar aos pés de Jesus. Quero que a minha vida, o meu carácter e as minhas acções falem por mim e que digam claramente e com força que sigo a Jesus Cristo.

Este desejo é tão forte em mim que me consideraria um privilegiado se, devido a este esforço combativo para ajudar os necessitados , os pobres e os cristãos perseguidos de Pakistão, Jesus quisesse aceitar o sacrifício da minha vida.

Quero viver em Cristo e morrer n’Ele. Não sinto medo neste país. Os extremistas tentaram muitas vezes matar-me, encarcerar-me; ameaçaram-me, perseguiram-me e aterrorizaram a minha família. Eu digo apenas que, enquanto estiver vivo, até ao meu último suspiro, continuarei a servir Jesus e esta pobre e sofredora humanidade, os cristãos, os necessitados, os pobres.

Creio que os cristãos de todo o mundo que em 2005 estenderam as mãos aos muçulmanos vítimas do terramoto, construíram uma ponte de solidariedade, amor, compreensão, colaboração e tolerância entre as duas religiões. Se estes esforços se mantiverem tenho a convicção de que ganharemos os corações e as mentes dos extremistas. Isto levar-nos-á a uma mudança positiva: as pessoas não mais se odiarão, não se matarão em nome da religião mas amar-se-ão uns aos outros, trarão harmonia, cultivarão a paz e a compreensão nesta região do mundo.

Creio que os mais necessitados, qualquer que seja a sua religião, devem ser tratados, sobretudo, como seres humanos. Estas pessoas são parte do meu corpo em Cristo, são a parte perseguida e necessitada do Corpo de Cristo. Se levarmos a cabo esta missão, então teremos ganho um lugar aos pés de Jesus e eu poderei olhar o seu rosto sem sentir vergonha.
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quinta-feira, 10 de março de 2011

Terapia do elogio



Terapeutas que trabalham com famílias divulgaram numa recente pesquisa que os membros das famílias  estão cada vez mais frios, mais distantes,  o carinho é cada vez menos, não se valorizam as qualidades, facilmente se ouvem críticas. As pessoas estão cada vez mais intolerantes e desgastam-se na valorização dos defeitos dos outros.

A ausência de elogio está cada vez mais presente nas famílias. Não vemos mais os homens a elogiar as suas mulheres ou vice-versa, não vemos os chefes a elogiar o trabalho de seus subordinados, não vemos mais pais e filhos  a elogiar-se; etc.

Só vemos futilidades:  valorizam-se artistas, cantores, jogadores, pessoas que usam a imagem para ganhar dinheiro e que, por consequência, são pessoas que tem a obrigação de cuidar do corpo, do rosto, das aparências.

A ausência de elogio afecta muito as pessoas e as famílias.

Há falta de diálogo nos lares.  O orgulho e a agitação da vida impede que as pessoas digam o que sentem.

Depois despejam-se essas carências nos consultórios. Acabam-se casamentos, alguns procurando noutra pessoa o que não conseguem dentro de casa.

Vamos começar a valorizar as nossas famílias, os nossos amigos, alunos ou  subordinados.
Vamos elogiar o bom profissional, a boa atitude, a ética, a beleza do parceiro ou parceira, o comportamento de nossos filhos.
O bom profissional gosta de ser reconhecido, o bom filho fica feliz por ser louvado, o pai e a boa mãe sentem-se bem ao serem amados e amparados.

O amigo quer sentir-se querido.

Vivemos numa sociedade em que cada um precisa do outro; é impossível uma pessoa viver sozinha e sentir-se feliz. Os elogios são forte motivação na vida de cada um.

Quantas pessoas posso fazer hoje feliz elogiando-as de alguma forma?

Começa agora!

És uma pessoa maravilhosa!
Desejo-te um excelente e feliz dia!
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quarta-feira, 9 de março de 2011

Viver



Eu fico
Com a pureza da resposta das crianças
É a vida, é bonita e é bonita.

Viver, e não ter a vergonha de ser feliz
Cantar e cantar e cantar
A beleza de ser um eterno aprendiz
Ah meu Deus eu sei, eu sei
Que a vida devia ser bem melhor e será
Mas isso não impede que eu repita
É bonita, é bonita e é bonita!

E a vida
E a vida o que é diga lá, meu irmão
Ela é a batida de um coração
Ela é uma doce ilusão, ê ô
Mas e a vida
Ela é maravida ou é sofrimento
Ela é alegria ou lamento
O que é, o que é, meu irmão
Há quem fale que a vida da gente é um nada no mundo
É uma gota é um tempo que nem dá um segundo
Há quem fale que é um divino mistério profundo
É o sopro do criador
Numa atitude repleta de amor
Você diz que é luta e prazer
Ele diz que a vida e viver
Ela diz que melhor é morrer pois amada não é
E o verbo é sofrer
Eu só sei que confio na moça
E na moça eu ponho a força da fé
Somos nós que fazemos a vida
Como der ou puder ou quiser
Sempre desejada
Por mais que esteja errada
Ninguém quer a morte
Só saúde e sorte
E a pergunta roda
E a cabeça agita.

Eu fico
Com a pureza da resposta das crianças
É a vida, é bonita e é bonita

Viver, e não ter a vergonha de ser feliz
Cantar e cantar e cantar
A beleza de ser um eterno aprendiz
Ah meu Deus eu sei, eu sei
Que a vida devia ser bem melhor e será
Mas isso não impede que eu repita
É bonita, é bonita e é bonita!
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quinta-feira, 3 de março de 2011

Discurso do Rei



"Fui ver pela segunda vez o Discurso do Rei. Já não via filmes no cinema duas vezes, desde que era pequenina e arrastava os meus pais para os filmes da Disney, que eles já sabiam de cor. Claro que há filmes que repito, mas ir duas vezes ao cinema ver o mesmo filme, é raro.

Há filmes que nos tocam, como diria Alexandre O'neill a propósito de palavras, como se tivessem boca. Este filme arrepiou-me da primeira vez e, na segunda, continuou a mexer comigo.

Se tivesse que o resumir, que não posso, já sem focar a excelente performance dos actores principais, diria que este filme vai muito além de uma mera biografia do Rei Jorge VI. Diria que representa o bloqueio que, tantas vezes, o medo assume nas nossas vidas assustadas. E que uma pessoa que confie em nós e que nos mostre como somos maiores do que imaginamos, pode determinar uma grande vitória. Vi perseverança, luta contra as falhas e como isso pode ser tão difícil, uma vez que afecta várias camadas de nós.

Eu tinha medo de falar em público. Não imaginam o que me assustava ver pessoas a olhar para mim, à espera que proferisse qualquer coisa sábia e eloquente. O meu cérebro escapulia-se para todos os sítios, menos para onde devia. E as pessoas interrogavam-me com olhares sérios.A minha barriga revirava-se ainda mais, as mãos suavam e os pés inquietavam-se. Hoje já o faço e, posso dizer que, até o faço bem. No entanto, foi uma guerra bem fria. Implicou terapias radicais. E muita caça às bruxas. Não imaginam as figuras que, ainda hoje, faço no carro antes das apresentações, sob os olhares atentos de outros condutores. Adaptei os meus métodos.

Tenho um Professor que afirma que os talentos não são inatos. Somos nós que decidimos o que queremos e lutamos para o conseguir.

O Discurso do Rei tem, para mim, tudo isto na sua essência: Os discursos que nos põem à prova diariamente, e que desafiam os nossos limites, que não são mais do que os nossos discursos da vida".

Mia
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Vê que interessante a quantidade dos nossos antepassados: Pais: 2 Avós: 4 Bisavós: 8 Trisavós: 16 Tetravós: 32 Pentavós: 64 Hexavós: 128 Hep...