domingo, 21 de março de 2010

Credibilidade



O que torna crível o discurso não é a sua maior ou menor eloquência, nem sequer a maior ou menor precisão do ponto de vista doutrinário, mas a maneira como funciona na prática a representação concreta dos fundamentos éticos.

Diversas situações minam a confiança fundamental para viver em sociedade: está posta em questão a credibilidade das medidas para combater a crise, a credibilidade dos servidores da Igreja perante escândalos, a credibilidade dos políticos e dos economistas, a credibilidade da justiça e dos jornalistas. Não é novo que haja pressões de interesses, cedências aos instintos mais perversos, queda na corrupção, atrasos atávicos da justiça, ilusões de artistas da engenharia económica. A resistência, a firmeza perante as tentações, ou seja, a liberdade de espírito, é que está muito ausente do cultivo pessoal.

A todos compete servir, ao seu nível, para dar credibilidade às instituições e às profissões com maior alcance social. Será que continuamos a lamentar as consequências sem prevenir as causas? Há um dever fundamental e primário de sermos livres, de promover e educar para a liberdade como parte da transcendência humana. A valorização da liberdade humana é a forma mais verdadeira de responder à questão do mal no mundo, dos males que oprimem os nossos contemporâneos. Eis a eficácia maior da credibilidade cristã, já para D. António Ferreira Gomes (Cf. Cartas ao Papa, 165-166).

Detenho-me apenas em breve análise à credibilidade da Igreja. A sociedade actual, na qual a Igreja se integra, vinga-se em desenterrar casos do passado, merecedores de crítica clara, não para elevar o nível do futuro, mas para justificar a generalizada decadência e tentar abater a autoridade das poucas instâncias éticas. Aproveitam-se os pecados da Igreja para desacreditar o cristianismo e os valores cristãos. Mas os media não narram as maravilhas dos que se desgastam no dom de si aos outros, os que dedicam a sua vida a construir a justiça e a paz, os que na fidelidade optam por viver com os pobres, os que investigam para curar os males do mundo, os que na política e na justiça seguem a ética com liberdade da consciência.

Reparemos no exemplo claro de Jesus. Chocou as autoridades judaicas não a propósito da fé em Deus, mas ao ver como funcionava essa fé na relação com os pobres e os pecadores. Impõe-se no campo atingido pelo descrédito uma visão positiva e humanizada da sexualidade, com pleno sentido no amor. Importa desenvolver, neste campo da sexualidade e do matrimónio, reflexões credíveis, sérias, com respeito pela complexidade do mundo afectivo e com abertura às progressivas exigências da liberdade inaugurada por Cristo.

D. Carlos Azevedo, Bispo Auxiliar de Lisboa
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