sexta-feira, 30 de maio de 2014

Quando reconheço a falta



«Quando reconheço ter caído nalguma falta, 
concordo que fiz mal e digo: 
“é o meu natural, só isto é que sei fazer”; 
se não faltei em nada, dou graças a Deus 
e confesso que foi porque Ele me ajudou.»

Frei Lourenço da Ressurreição | 1614 – 1691 
A prática da presença de Deus. IV, 3

Senhor,
também eu caio em inúmeras faltas e imperfeições
ao longo de cada dia.
Sei que sou limitado, mas tantas vezes custa-me reconhecê-lo.
Certamente toda a graça e todo o bem vêm de Ti,
mas quantas vezes os desejo atribuir a mim próprio.
Senhor, desejo atribuir-me o que não sou
e não reconhecer o que sou.
E tudo isto, Senhor, porque ainda não Te conheço,
não conheço o olhar de amor
com que Te delicias inclinar-Te
para o pobre e o humilde;
porque ainda não experimentei o amor
com que curas os meus pecados;
porque ainda não reconheço que as provas a que me submetes
são apenas caminhos para me atraires a Ti…
Senhor, por causa de toda esta minha cegueira,
ando em busca de mim,
de um eu mais forte e melhor,
quando haveria de andar em busca de Ti,
que tens tudo para me dar.
Ensina-me a humildade,
que me faz reconhecer a minha verdade sem depressão
e a Tua verdade de amor, com alegria!

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Recomeça sempre!



Não desistas nunca,
Nem quando o cansaço se fizer sentir,
Nem quando os teus pés tropeçarem,
Nem quando os teus olhos arderem,
Nem quando os teus esforços forem ignorados,
Nem quando a desilusão te abater,
Nem quando o erro te desencorajar,
Nem quando a traição te ferir,
Nem quando o sucesso te abandonar,
Nem quando a ingratidão te desconsertar,
Nem quando a incompreensão te rodear,
Nem quando a fadiga te prostrar,
Nem quando tudo tenha o aspecto do nada,
Nem quando o peso do pecado te esmagar...
Invoca Deus, cerra os punhos, sorri...
E recomeça!

S. Leão Magno

domingo, 25 de maio de 2014

O nada leva ao Tudo



«Tudo possui quem nada tem.» 

Santa Teresa Benedita da Cruz 
1891 – 1942 | Obras 229


Eterno Pai,
obrigado por me ensinares a contemplar-Te
como o verdadeiro pobre.

Tu és o único que tudo possui,
Aquele que é o princípio de todas as coisas
e pelo qual todas subsistem.

Tu com a Tua força criadora
fazes nascer o dia e chegar a noite;
germinar a semente e nascer a flor e o fruto,
crescer a criança e amadurecer o adulto.

Tu és essa energia de vida
que em Si tudo possui,
mas na realidade em Si nada tem.

Caio de joelhos quando rezo o mistério da geração do Verbo
e Te vejo, na fé, despojares-Te de Ti mesmo
para Te fazeres dom de amor ao Teu Filho Amado.

Caio de joelhos quando rezando Te chamo de Pai,
porque isso supõe que te esvazias de Ti
para seres em mim.

Pai,
Tu és o verdadeiro Pobre
que reclama a minha pobreza,
para me encheres da riqueza do Teu amor
que é comunhão com Cristo, no Espírito,
presente em cada irmão.

Pai obrigado
por seres o Pobre
mendigo do meu coração.

sábado, 24 de maio de 2014

A vida não vivida



Faz sentido deixarmos de existir? Não. A prova evidente é que também não parece fazer grande sentido existirmos e... aqui estamos! Chegados do nada.

Em vários momentos da sua vida, cada pessoa dá-se conta da realidade da própria morte... o confronto com a ideia desta verdade pode mudar quase tudo. Deixam de se sentir os dias e as noites da mesma forma, porque se pressente o próprio apocalipse e, em função dele, reordena-se a vida. Claro, há quem nem seja capaz de perceber o básico e continue como se a morte fosse algo que apenas acontece aos outros.

Há um instinto primário em todos os seres vivos que os leva a lutarem pela sobrevivência. O homem será o único que tem consciência plena da inevitabilidade do seu fim temporal, lutando assim, mais do que pela sua vida, pela sua imortalidade, buscando garantir que a sua vida passa para além da própria morte.

A morte não tem de ser a frustração definitiva do desejo de felicidade.

Devemos agir sempre de acordo com o futuro que julgamos melhor, mas sempre sem grandes pressas nem perdas de tempo. Com toda a intensidade possível, mas com critério e sem exageros.

Será o medo da morte uma forma de amor incondicional à vida?  De onde chega ao amor a garantia de que a morte não lhe impede a realização plena?

As perguntas pertinentes sem resposta não significam que haja falta de sentido ou verdade, mas tão só que vivemos um mistério... onde o nada aparente não tem de significar vazio, podendo mesmo ser o sinal de uma imensidão sublime.

Faz sentido deixarmos de existir? Não. A prova evidente é que também não parece fazer grande sentido existirmos e... aqui estamos! Chegados do nada. Nós, o leitor e eu, nós mesmos, não quaisquer outros em nosso lugar... outros filhos dos nossos pais ou de outros pais... não... Nós mesmos. Não somos seres insignificantes e dispensáveis.  Cada um de nós faz sentido e faz parte do sentido da vida. Ainda que não saibamos como, porquê ou para quê...

Num cemitério estão, lado a lado, os restos dos corpos dos que deixaram saudades e dos que não as semearam. Cada um de nós escolhe a sua vida, embora ninguém possa assumir-se como causa principal de si mesmo.

Existimos, mas por um sentido que nos ultrapassa. Maior que a nossa compreensão. O que não somos é migalhas de uma explosão do acaso. Isso é que não faz sentido nenhum.

Temos pouco tempo, mas não parece. Basta que analisemos o quanto  desperdiçamos em atividades supérfluas... Talvez a vida seja muito longa para alguns. Quando a esperança de vida aumenta, dilata-se-lhes a velhice e não a juventude... não sabem o que fazer com a vida.

Aproveitar o tempo não é fazer muitas coisas … é fazer o que é bom não só para esta fase da nossa vida, mas também para a sua totalidade, ser autor apenas do que em sentido de eternidade tem valor. Tudo o mais, por mais importante que possa parecer, é caduco.

A certeza da morte devia despertar-nos para o valor do tempo. A perspetiva de uma morte próxima faz com que se descubram as inúmeras belezas que há nas coisas mais simples. Mas estas perfeições estão sempre lá... por que razão não as sentimos e usufruímos sem ter de ser a morte a abrir-nos os olhos?

O silêncio com que sorrio e choro não é o mesmo. Mas será sempre uma mesma verdade que jaz no fundo do que sou. A certeza de que a minha história começou muitos anos antes de eu ter nascido. Uma eternidade antes.

Só vive a solidão da vida e da morte quem escolhe viver sem amor.

Há quem anseie pela vida eterna, mas desespere com a vertigem de uma tarde livre de domingo... que castigo será a imortalidade para quem não sabe amar! Afinal, a eternidade não é um tempo sem fim, mas a ausência do tempo... num amor infinito!

É pouco o nosso tempo aqui. Tratemos de garantir que depois da morte teremos saudades do que fizemos neste mundo, procurando a vida que há em cada dia, vivendo-a como um dom que merecemos e... levando-a dentro do coração!

José Luís Nunes Martins
in jornal i

sexta-feira, 23 de maio de 2014

O meu tesouro



Senhor
eu podia, como outros, agradar-Te e ter alguém;
poderia, como tantos, afirmar "sou teu"
e também dizer: "és minha, és meu".
Poderia ser escolhido e escolher
decidir sem perguntar o Teu querer
possuir e usar os bens do mundo
como outro qualquer.

Mas porque me chamaste e escolheste
e livremente me entreguei a Ti
sou apenas Teu, e em Ti, de todos.
Não sou dono de mim, não me pertenço,
nada tenho e também nada me falta.
Vivo do Teu Amor e posso amar
e ser pão repartido, vida entregue.

E vou-me dando conta de que ao dar-me
muitos outros recebem vida eterna.
Por eu Te pertencer sou tão amado
e por eu Te seguir a muitos salvas,
e por seres o meu tesouro os enriqueces.

Quantos me procuram e Te encontram!
Porque sou alguém que Tu habitas
reconhecem em mim traços do Teu rosto
sinais da paternidade d'Aquele que Te enviou.

Tu és o meu tesouro, a minha herança.
Defende-me da vaidade e da mentira!
Por aqueles que me deste, Senhor,
mantém-me sempre fiel
conserva-me feliz no Teu amor.

Autor anónimo

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Adote um padre



Para recolher fundos, as dioceses lançaram uma campanha sem
precedentes na internet usando as mesmas ferramentas de um site popular
para os jovens.

"Um produto 100% divino que precisa de si em adopteuncure.com [trad: adoptaumpadre.com]".

Não é uma piada de mau gosto, é uma campanha de angariação de fundos, lançada
sexta-feira na net pelas seis dioceses da Normandia. Além do clássico apelo
à generosidade, a Igreja espera arrecadar dinheiro através de "adopteuncuré.com ".

(...) O objetivo ? Atrair jovens doadores para a côngrua (francês: denier du culte),
uma contribuição paga pelos fiéis para sustentar o clero e apoiar as atividades da Igreja.

A campanha, transmitida exclusivamente na internet, "tem como alvo o segmento
18-40 anos", disse o vigário-geral da diocese de Bayeux , o Padre Xavier Signagout .

"Nova promoção de jovens seminaristas"

O site abre com um jovem sorridente com traje eclesiástico. Ao lado uma etiqueta diz
"novidade" e uma legenda: "produto divino para aproveitar já."

(...)  Mas a campanha tem mais. Para valorizar o trabalho dos padres, o site inclui
um vídeo (ver acima). Com fundo de cânticos religiosos, uma voz suave destaca os méritos
de um jovem sacerdote .

E "Adopteuncuré.com" não se esquece de especificar que os donativos para a igreja são
dedutíveis.

sábado, 17 de maio de 2014

A fé no amor



Ninguém vive sem acreditar. É a fé que nos abre as portas do mundo. Uma graça que nos lança para diante, que nos propõe a liberdade de uma vida nova, que busca e encontra o que os olhos não vêem e as mãos não tocam.

A existência humana é um mistério que se mostra através de sinais. Só a fé nos revela a verdade de nós mesmos. Confiar é abrir-se e aceitar o que se abre a nós. A fé é o que permite ao homem viver com sentido, ter a coragem de ser feliz, acolhendo a graça até mesmo na desgraça.

Há na vida tanto que nos ultrapassa... É essencial acreditarmos na generosidade e na bondade dos outros e de tudo o que não depende de nós. Compreendermos que em conjunto podemos fazer aquilo que sozinhos não somos capazes.

Quando amo, tenho fé em alguém, estou convicto do seu valor: uma certeza que se prova, mas não se demonstra, que é capaz de me mover e comover até ao melhor de mim. Um abandono confiante que arrisca tudo ao encontro com o outro. Uma vontade de me dar e de me abrir.

A fé é sempre num outro. Eu próprio, na minha maior bondade, sou um outro em que acredito. Talvez por isso não haja homem mais pobre do que aquele que perdeu a fé no amor, porque assim se perdeu de si mesmo.

Nem tudo pode ser compreendido. Mas não deixa, por isso, de ser verdade. Para compreender é preciso amar. Mas ninguém é capaz de amar quando vive desconfiado e sem esperança. A fé complementa a razão.

O amor é o princípio e a perfeição de qualquer relação, na medida em que se torna a firme esperança que ilumina todo o caminho a partir do seu destino.

Acreditar é o primeiro passo para a criação neste mundo do milagre do amor. Sempre que duas mãos livres e abertas se encontram, rezam.

José Luís Nunes Martins 
jornal i
17 maio 2014
http://www.ionline.pt/iopiniao/fe-no-amor
Ilustração de Carlos Ribeiro

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Três árvores



Havia no alto de uma montanha três árvores. Elas sonhavam com o que iriam ser depois de grandes. A primeira, olhando as estrelas disse: 
- Eu quero ser o baú mais precioso do mundo e viver cheia de tesouros. 
A segunda, olhando um riacho suspirou: 
- Eu quero ser um navio bem grande para transportar reis e rainhas.
A terceira olhou para o vale e disse: 
- Quero crescer e ficar aqui no alto da montanha; quero crescer tanto que as pessoas ao olharem para mim, levantem os olhos e pensem em Deus. 

Muitos anos se passaram, as árvores cresceram. Surgiram três lenhadores que, sem saber do sonho das árvores, cortaram as três. A primeira árvore acabou se transformando num cocho de animais, coberto de feno. A segunda virou um barco de pesca transportando pessoas e peixes todos os dias. A terceira foi cortada em vigas e deixada num depósito. Desiludidas as três árvores lamentaram os seus destinos. 

Mas, numa certa noite, com o céu cheio de estrelas, uma jovem mulher colocou o seu bebé recém-nascido naquele cocho. De repente, a árvore percebeu que continha o maior tesouro do mundo. 

A segunda, certo dia, transportou um homem que acabou por dormir no barco. E, quando uma tempestade quase afundou o barco, o homem levantou-se e disse paz! E, imediatamente, as águas se acalmaram. E a árvore transformada em barco entendeu que transportava o rei dos céus e da terra. 

Tempos mais tarde, numa Sexta-feira, a árvore espantou-se quando as vigas foram unidas em forma de cruz e um homem foi pregado nela. A árvore sentiu-se horrível vendo o sofrimento daquele homem. Mas logo entendeu que aquele homem salvou a humanidade e as pessoas logo se lembrariam de Deus ao olharem para a cruz. 

O exemplo das árvores é um sinal de que é preciso sonhar e ter fé. Sempre! Não importa o tamanho dos sonhos que tenha. Sonhe muito e sempre. Mesmo que os seus sonhos não se realizem exatamente como desejou, saiba que eles se concretizarão da maneira que Deus entendeu ser a melhor para si. 

Uma nuvem não sabe por que se move em tal direção e em tal velocidade. Sente apenas um impulso que a conduz para esta ou aquela direção. Mas o céu sabe os motivos e os desenhos por trás de todas as nuvens, e você também saberá, quando se erguer o suficiente para ver além dos horizontes.

quinta-feira, 15 de maio de 2014

Família ou a arte dos equilíbrios



Claro que a família só podia estar a atravessar uma profunda crise neste nosso mundo ocidental ávido de controlo, utilitário e politicamente correto.

Embarcar numa coisa dessas é, em boa verdade, uma completa insanidade. Para começar, confiar noutra pessoa e entregar-se a ela totalmente. Confiar? Que grande burrice. Entregar-se? Só com muitas seguranças a toda a volta, e mesmo assim com grandes reservas. Filhos? Sabemos lá o que vem por aí… Choros, birras, fraldas? Horas de mamada? Que prisão!

Dois filhos? Ai, isso é a duplicação daquele esforço que nem é bom lembrar… Mais uma cadeirinha, mais choros e birras e noites sem dormir, e fraldas e dentes a romper do mais velho, que grande barafunda…
Três? Uiii, uiii, a avó torce o nariz, “eles é que sabem”, em tom reprovador, “que isto da vida não está para filhos…” Aí o caldo já se entornou completamente. Ao terceiro já ninguém liga, “eles são doidos, vivam lá com a doidice deles”…

Quarto. Bom, a partir daqui está declarada publicamente a loucura daquela malta. Passam a sofrer externamente do preconceito “de quem não sabe o que anda a fazer na vida, coitados…” E aí por diante. “Quantos são eles? Nem sei…”

Dentro daquelas portas, aparentemente nenhuma peça do puzzle encaixa. Mas o certo é que há puzzle. Ninguém é o centro, o centro está sempre fora, num qualquer “outro”: nos dilúvios da adolescente, nas travessuras do terceiro, na timidez do do meio, nas preocupações dos testes, nas saídas do mais velho, sei lá em quantas coisas mais.

Chegar a casa e calçar as pantufas é fantasia. Os dias estão cheios de heroicidades banais, como adiar a palermice de ficar a olhar para a televisão sem a ver para ir mandar umas boladas com os filhos, ou apenas estudar com eles, ou fazer umas criações culinárias.

A família leva-nos a alma, mas só aí ficamos maiores. Ter família é dizer adeus à rotina confortável, às previsões, à ilusão da perfeição – porque o amor mostra-nos que nunca damos o suficiente, nunca estamos suficientemente à altura, nunca somos suficientemente amantes.

Muitos se perguntarão: “Mas por que é que eles têm filhos?” As respostas podem ser inúmeras, mas em todas elas deve haver essa lógica invertida da realidade, como o barco do “Pirata das Caraíbas” que se vira e encontra um mundo novo. É ter um eixo que não é substituível, é ter o coração cheio do único que é preciso, é viver de amor.

Por isso e por muito mais, parabéns a todas, queridas Famílias!
 
Dina Matos Ferreira

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Expedição de marcianos



E se "uma expedição de marcianos" quisesse o baptismo?

Sim, marcianos, "verdes, com narizes compridos e orelhas grandes, tal como nos desenhos das crianças". "O Espírito faz escolhas impensáveis, inimagináveis", lembra Francisco.

O Papa surpreendeu os fiéis que marcaram presença na missa desta segunda-feira de manhã.  “Se, por exemplo, amanhã chegasse uma expedição de marcianos?”, perguntou. E se quisessem ser baptizados, "o que é que aconteceria?”.

Perante a cara estupefacta de quem duvidava ter ouvido bem, Francisco esclareceu que estava mesmo a falar de hipotéticos extraterrestres que pretendessem ser baptizados: “Verdes, com narizes compridos e orelhas grandes, tal como nos desenhos das crianças”.

O Santo Padre usava o exemplo para realçar a importância de ninguém fechar as portas ao Espírito Santo, mesmo quando isso resulta nas situações mais improváveis: “Quando o Senhor nos mostra o caminho, quem somos nós para dizer ‘Não, Senhor, não é prudente! Não, façamos de outra maneira’. Quem somos nós para fechar portas?”, perguntou.

O Papa referiu a tradição que algumas igrejas têm de ter assistentes que recebem os fiéis à porta da Igreja, para os guiar para os lugares disponíveis na assembleia. Mas, realçou Francisco, “nunca existiu um ministério para quem fecha a porta aos outros. Nunca”.

“O Espírito faz escolhas impensáveis, inimagináveis”, disse Francisco. “E enquanto cristãos devemos pedir ao Senhor a graça da docilidade aos Espírito Santo”.

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Ai trabalha, trabalha!

                                             
 

O jornalista Andrea Tornielli conseguiu bisbilhotar a zona onde as câmaras da televisão já não entram e tirou a fotografia. A notícia tem três dias, no momento em que escrevo.

Junto à porta do quarto 201 da Casa de Santa Marta (o quarto do Papa Francisco), dorme um S. José de madeira, em cima de uma mesa. Entalados, por baixo, os bilhetinhos que o Papa lhe escreve.

Toda a gente sabe que o Papa Francisco tem uma confiança total em Nossa Senhora e em S. José. O entusiasmo acabou por contagiar toda a casa, dos monsenhores aos guardas suíços. Um dos colaboradores conta que o Papa lhe disse:

‒ «Sabes, é preciso ter paciência com estes carpinteiros: dizem que fazem um móvel em duas semanas e depois demoram um mês. Mas fazem-no e trabalham bem! É preciso é ter paciência...».

A imagem mede 40 cm e foi das poucas coisas que o Papa mandou vir de Buenos Aires. Aparentemente, S. José dorme, mas a imagem representa uma outra actividade, relatada no Evangelho: mais do que dormir, S. José escuta a voz de Deus durante a noite e dispõe-se a cumpri-la. É isso que interessa ao Papa.
Aliás, para uma figura que dorme, a imagem não pára quieta na sua mesa. Às vezes, quando o trabalho de S. José aperta, isto é, quando o número de bilhetinhos aumenta, a estátua fica empoleirada num monte de papelada.

‒ «O Santo Padre dá muito trabalho a S. José. A devoção já se pegou a todos os que trabalham à volta da residência de Francisco, incluindo os Guardas Suíços…».

Bento XVI tinha decidido introduzir em todas as orações eucarísticas uma referência a S. José, logo a seguir à invocação de Nossa Senhora, mas preferiu deixar o assunto ao seu sucessor. O Papa Francisco não perdeu tempo a confirmar a decisão.

No dia 5 de Julho de 2013, o Papa Francisco, acompanhado por Bento XVI, foi consagrar o Estado do Vaticano a S. José. A cerimónia também já estava programada no pontificado anterior, mas nem por isso teve menos significado:

‒ «S. José, (…) consagramos-te as fadigas e as alegrias de cada dia; consagramos-te as expectativas e as esperanças da Igreja; consagramos-te os pensamentos, os desejos e as obras: tudo se cumpra no Nome do Senhor Jesus».

O início deste pontificado deu-se a 19 de Março de 2013, festa de S. José, e, na homilia da Missa, o Papa Francisco sublinhou o significado dessa circunstância.

‒ «Nunca esqueçamos que o verdadeiro poder é o serviço e que, para exercer o poder, também o Papa se deve meter cada vez mais naquele serviço que culmina na Cruz. Deve olhar para o serviço humilde, concreto, rico de fé, de S. José e abrir os braços, como ele, para guardar todo o povo de Deus e acolher com afecto e ternura a humanidade inteira, especialmente os mais pobres, os mais débeis, os mais pequenos… só quem serve com amor sabe guardar!».

Há poucos dias, a crónica de Andrea Tornielli sobre o Primeiro de Maio no Vaticano centrou-se nesta mesa rústica, junto à porta 201 da Casa de Santa Marta, onde dorme um Papa e trabalha um S. José ‒ que parece dormir mas, afinal, trabalha bastante. Ai trabalha, trabalha!

José Maria C. S. André 
«Correio dos Açores», «Verdadeiro Olhar» (11-V-2014) 

domingo, 11 de maio de 2014

O Bom Pastor



Amo andar pelas tardes sem som, brandas, maravilhosas
Com riscos de andorinhas pelo céu.
Amo ir solitário pelos caminhos
Olhando a tarde parada no tempo
Parada no céu como um pássaro em vôo
E que vem de asas largas se abatendo.
Amo desvendar a vaga penumbra que desce
Amo sentir o ar sem movimento, a luz sem vida
Tudo interiorizado, tudo paralisado na oração calma...

Amo andar nessas tardes...
Sinto-me penetrando o sereno vazio de tudo
Como um raio de luz.
Cresço, projeto-me ao infinito, agitando
Para consolar as árvores angustiadas
E acalmar os pinheiros moribundos.
Desço aos vales como uma sombra de montanha
Buscando poesia nos rios parados.
Sou como o bom-pastor da natureza
Que recolhe a alma do seu rebanho
No agasalho da sua alma...

E amo voltar
Quando tudo não é mais que uma saudade
Do momento suspenso que foi...
Amo voltar quando a noite palpita
Nas primeiras estrelas claras...
Amo vir com a aragem que começa a descer das montanhas
Trazendo cheiros agrestes de selva...
E pelos caminhos já percorridos, voltando com a noite
Amo sonhar...'

Vinicius de Moraes

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Número um



Sempre que vou buscar o meu filho Vasco à escola, um amigo dele, o João Tomás, corre na minha direcção, puxa-me pelo casaco, e diz-me que um dia gostava muito de ir brincar lá para casa.
- “Vamos combinar então. Sabes o número do teu pai?”, perguntei-lhe uma tarde.
O João olhou para mim admirado:
- “Sei, claro, o meu pai é o número um.”
Fiquei calada de telemóvel na mão, sem possibilidade de combinar o que quer que fosse com o pai do João mas enternecida e com a convicção de que deveria ser assim sempre.
Será que um dia todos os pais serão heróis para os seus filhos? Quero acreditar que sim!

Carla Rocha

quinta-feira, 8 de maio de 2014

O centro da alma



«O centro da alma
é o lugar em que se percebe a voz da consciência,
e, o lugar das decisões livres.
Porque isto é assim
e porque para a união com Deus
é necessária a entrega pessoal e voluntária,
o lugar da livre decisão
tem que ser o mesmo da união com Deus.»

Santa Teresa Benedita da Cruz | 1891 - 1942
Edith Stein Obras 446

Ó meu Deus,
entrando em mim descubro o mistério
do meu próprio crescimento espiritual.
Descubro esta interioridade
como impulso necessário
para a minha realização como pessoa.
Eu Te dou graças
porque ao escutar a voz da minha consciência,
no mais profundo de mim mesmo,
descubro a essência e a vocação
do meu próprio ser;
descubro que cada pessoa tem inscrita
no seu coração,
como essência e vocação,
a Tua vontade
e o chamamento à união contigo.
Meu Deus,
Faz-nos escutar e voz da nossa consciência
E torna-nos conscientes do caminho espiritual
que diariamente, a Tua Benevolência,
nos faz viver.

quarta-feira, 7 de maio de 2014

Deus em primeiro lugar


   
"Não ficou sem fruto a discussão difícil e intrincada, pois um dos temas – o primeiro a ser examinado e o primeiro, em certo sentido, na excelência intrínseca e na importância para a vida da Igreja –, o da sagrada Liturgia, foi felizmente concluído e é hoje por Nós solenemente promulgado. Exulta o Nosso espírito com este resultado. Vemos que se respeitou nele a escala dos valores e dos deveres: Deus, em primeiro lugar; a oração, a nossa primeira obrigação; a Liturgia, fonte primeira da vida divina que nos é comunicada, primeira escola da nossa vida espiritual, primeiro dom que podemos oferecer ao povo cristão que junto a nós crê e ora, e primeiro convite dirigido ao mundo para que solte a sua língua muda em oração feliz e autêntica e sinta a inefável força regeneradora, ao cantar connosco os divinos louvores e as esperanças humanas, por Cristo Nosso Senhor e no Espírito Santo" (Paulo VI, Alocução no encerramento da 2ª Sessão do Concílio Vaticano II, 04-XII-1963).

Estas palavras foram pronunciadas pelo Papa Paulo VI ao terminar a segunda sessão do Concílio Vaticano II e ao promulgar o seu primeiro documento: a Constituição Sacrosanctum Concilium. Colocam-nos perante um tema que tem sido constante no magistério pontifício destes cinquenta anos: recuperar o primado de Deus. De facto, como tem recordado anos mais tarde Bento XVI, referindo-se ao Concílio Vaticano II: "Por meio deste começo com o tema da liturgia, punha-se de manifesto inequivocamente o primado de Deus e o primado do tema de Deus: Primeiro Deus, é o que nos diz o começar pela Liturgia" (Bento XVI, Prefácio, Obras completas, vol. 11).

Na nossa opinião, poder-se-ia afirmar que o Vaticano II começando pela liturgia deu ao Concílio uma arquitectura precisa: o primado da adoração, porque o primeiro é Deus. Assim colocava-se na linha da Regra beneditina: "Operi Dei nihil proponatur", que nada se anteponha à obra de Deus. Por sua vez, a Constituição Lumen gentium, sobre a Igreja, estaria essencialmente ligada à anterior. A Igreja deixar-se-ia guiar pela oração, pela missão de glorificar a Deus. Neste sentido, parece lógico que a terceira Constituição – Dei verbum – fale da Palavra de Deus que em todo tempo convoca e renova a Igreja. Finalmente, a quarta Constituição – Gaudium et spes – mostraria como tem lugar a glorificação de Deus na vida activa: levando ao mundo a luz recebida de Deus, o mundo transforma-se e converte-se plenamente na glorificação de Deus. A glória de Deus é o homem vivente (cf. 1 Co 10, 31). E a vida do homem é a visão de Deus, como dizia Santo Ireneu.

Recuperar este "primado" de Deus era um objectivo fundamental do Concílio Vaticano II. E continua a sê-lo. João Paulo II recordou-o aos 25 anos da Sacrosanctum Concilium, e agora o Papa Francisco continua a recordar essa necessidade de dar a Deus o primeiro lugar: "Não é útil dispersar-se em muitas coisas secundárias ou supérfluas, mas concentrar-se na realidade fundamental que é o encontro com Cristo, com a sua misericórdia, o seu amor, e em amar os irmãos como Ele nos amou. Um encontro com Cristo que também é adoração, palavra pouco usada: adorar a Cristo (Discurso ao Conselho Pontifício para a promoção da Nova Evangelização, 14-X-2013).

Com a sua linguagem directa, o Bispo de Roma pergunta: "Tu, eu, adoramos o Senhor? Vamos ter com Deus só para pedir, para agradecer, ou vamos até Ele também para O adorar? Mas então que significa adorar a Deus? Significa aprender a estar com Ele, demorar-se em diálogo com Ele, sentindo a sua presença como a mais verdadeira, a melhor, a mais importante de todas" (Papa Francisco, Homilia na Missa em S. Paulo Extramuros, 14-IV-2013).

Este significado de adoração, que apresenta o Papa Francisco, tem consequências práticas imediatas que se referem aos edifícios de culto e às celebrações litúrgicas. Concluímos com as suas palavras concretas e directas que movem ao exame e a pôr-se em caminho: "O templo é o lugar onde a comunidade acorre para rezar, louvar o Senhor, agradecer. De facto, no templo adora-se o Senhor. Este é o ponto mais importante. E esta verdade vale para todo o templo e para toda a cerimónia litúrgica onde aquilo que é mais importante é a adoração, não os cânticos ou ritos, embora sejam belos. Toda a comunidade reunida olha para o altar onde se celebra o sacrifício e adora. Humildemente creio que nós os cristãos talvez tenhamos perdido um pouco o sentido da adoração. Pensamos: vamos ao templo, reunimo-nos como irmãos, e isto é bom, é belo. Mas o centro está ali onde está Deus. Nós adoramos a Deus” (Homilia, Casa de Santa Marta, 22-XI-2013).


JUAN JOSÉ SILVESTRE
Professor de Teologia Litúrgica
Universidade Pontifícia da Santa Cruz (Roma)
Artigo publicado na revista “Palabra” (Madrid, Janeiro de 2014)

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Carta às mães mais que perfeitas



Querida Mãe:

Eu já te vi por aí.
Eu vi-te a gritar com os teus filhos em público, vi-te a ignorá-los no parque, vi-te a levá-los à escola antes de teres tomado banho, e de calças de pijama por baixo do casaco.
Eu vi-te a implorares aos teus filhos, vi-te a suborná-los, e a ameaçá-los.
Eu vi-te a gritar feita louca com o teu marido, com a tua mãe, e com o agente de polícia no cruzamento da escola.
Eu já te vi a correr com os miúdos de um lado para o outro, a sujares-te no parque e a praguejares em voz alta depois de bateres com o joelho na esquina da cadeira.
Eu vi-te a partilhares um leite achocolatado com um maníaco de 4 anos. Vi-te a limpar o nariz dos teus filhos com os dedos e a limpa-los na parte de trás das calças de ganga. Vi-te a correr com o teu bebé de 2 anos pendurado na dobra do teu braço, para apanhares a bola que está a fugir para a estrada.
Eu já te vi a ranger os dentes enquanto o teu filho gritava contigo porque não queria ir à aula de piano, à natação, ou ao treino de futebol. Eu vi-te a fechar os olhos e a respirar fundo depois de entornarem um copo de leite inteiro em cima. Vi-te a chorar desesperada enquanto tentavas tirar lápis de cera da tua melhor mala.
Eu já te vi na sala de espera do hospital. Eu vi-te no balcão da farmácia. Vi-te com o teu olhar cansado e assustado.

Eu não sei se tinhas planeado ser mãe ou não.
Se soubeste desde sempre que querias pôr crianças neste mundo, cuidar deles, ou se a maternidade te apareceu de surpresa.
Não sei se correspondeu às tuas expetativas, ou se passaste os primeiros tempos como mãe aterrorizada porque tinhas imaginado que sentirias o “amor materno” doutra forma.
Não sei se tiveste dificuldade em engravidar, se perdeste algum bebé, ou se tiveste algum parto traumático.
Nem sequer sei, se concebeste o teu filho no teu ventre, ou se o acolheste na tua família.

Mas eu conheço-te.
Eu sei que não alcançaste tudo o que querias na vida. Sei que há coisas que nunca soubeste que querias até teres filhos.
Eu sei que, às vezes, pensas que não estás a dar o teu máximo e que podias fazer melhor.
Eu sei que olhas para os teus filhos e te revês neles.
Eu sei que às vezes apetece-te atirar um candeeiro ao teu filho adolescente, e atirar o de 3 anos pela janela.
Eu sei que há noites que, depois de deitar os miúdos, estás tão exausta que só te apetece enrolares-te na cama a chorar.
Eu sei que há dias tão difíceis que só queres que acabem depressa. Depois, na hora de ir para a cama os teus filhos abraçam-te e enchem-te de beijinhos, e dizem o quanto gostam de ti, e de repente querias que o dia durasse para sempre.

Mas nada dura para sempre.
Os dias terminam, e o dia a seguir é um novo desafio. Febres, desgostos amorosos, trabalhos da escola, novos amigos, novos animais de estimação e novas dúvidas. E todos os dias, fazes o que tens de fazer.
Vais trabalhar, ou ficas em casa pões o bebé na cadeirinha e ligas o aspirador. Ou vais até ao jardim passear com ele.
Largas tudo para moderar uma discussão sobre de quem é a vez de usar aquelas canetas especiais, para dar um beijinho ao óó da tua filha, ou para conversar sobre qual é a cor do batom que a mãe do Pinóquio usava.
Eu sei que fazes guerras de cocegas em castelos de lençóis, e que sabes de cor as histórias de, pelo menos, 8 livros ilustrados e todos os meus cds. Eu sei que danças de forma ridícula quando vocês estão sozinhos. E que inventam canções parvas sobre queijo, maus cheiros, ou ervilhas.
Eu sei que uma hora depois de deitares os teus filhos, largas o que estás a fazer e vais cortar as unhas do mais novo. Sei que paras de arrumar a cozinha, porque a tua filha te convidou para a festa de chá que está a fazer com as bonecas, e faz questão que lá estejas.
Eu sei o que custou tratares dos teus filhos quando tiveste aquela virose de 4 dias. Sei que comes os restos dos pratos deles, enquanto arrumas a cozinha.
Eu sei que não contavas com muitas destas coisas. Sei que não antecipaste amar alguém tão intensamente, ou andar tão cansada, ou ser a mãe em que te vieste a tornar.
Pensavas que tinhas tudo planeado. Ou então, estavas perdida e aterrorizada. Ias contratar a babysitter perfeita. Ou ias deixar de trabalhar e aprender tudo sobre crianças.
Sei que não és a mãe perfeita. Por mais que tentes, e por mais que te esforces. Tu nunca serás a mãe perfeita.
E isso, provavelmente, vai perseguir-te. Ou se calhar fizeste as pazes com isso. Ou talvez nem nunca tenha sido um problema.
Eu sei que acreditas que independentemente do que fizeres, poderias ter feito sempre mais.

A realidade é outra.
Não interessa o pouco que fizeste, no fim do dia os teus filhos vão sempre amar-te. Vão continuar a rir para ti, e acreditar que tens poderes mágicos que podes curar quaisquer coisas.
Independentemente do que acontecer no trabalho, na escola, ou num grupo de amigos, tu fazes, sempre, tudo o que está e não está ao teu alcance para garantir que no dia a seguir os teus filhos estarão tão felizes, saudáveis e espertos quanto é possível.

Feliz ou infelizmente, não há pais perfeitos. Os teus filhos vão crescer determinados a ser diferentes de ti. Vão crescer com a certeza de que não vão pôr os seus filhos nas aulas de piano, de que vão ser mais brandos, ou mais rigorosos, ou ter mais filhos, ou ter menos, ou não ter nenhum.
Um dia os teus filhos vão estar a correr como loucos na igreja, a portar-se pessimamente no restaurante a fazer caretas para o lado, e alguém vai passar e elogiar a tua família.

Uma certeza podes ter: não és perfeita!
E isso é bom. Porque na realidade, nem os teus filhos são perfeitos. E ninguém no mundo se preocupa mais com eles do que tu, ninguém sabe porque é que eles estão a chorar senão tu, ninguém percebe as piadas deles melhor do que tu.
E já que ninguém é perfeito, tens de desempatar com 2 biliões de pessoas que estão em primeiro lugar “ex aequo” para concorrer à melhor mãe do mundo.
Parabéns melhor Mãe do Mundo. Tu não és perfeita. És mais que perfeita:

És tão boa mãe como o resto do mundo.

Lea Grover

Vê que interessante a quantidade dos nossos antepassados: Pais: 2 Avós: 4 Bisavós: 8 Trisavós: 16 Tetravós: 32 Pentavós: 64 Hexavós: 128 Hep...