O amor é um ato íntimo, original e singular. Uma força que se define cada vez que se faz protagonista de uma vida concreta.
Amar não supõe reciprocidade. Será o nosso natural egoísmo que tende a fazer-nos crer (e querer) que a felicidade passa por recolher o máximo sem ter de entregar o mínimo. Quando a verdade é o rigoroso oposto disso: feliz será quem dá tudo sem querer receber nada em troca. Amar é abdicar de si, fazer-se uma abundante fonte de bem.
O amor não é universal nem frequente. Poucos são capazes de compreender que o valor de uma existência é servir outra. Ser instrumento. Entregar a própria vida em favor da realização da felicidade de outra, sem contar perdas ou recompensas pelos seus gestos.
Um dos principais equívocos a respeito do amor resulta da semelhança que se encontra entre o (meu) egoísmo e o amor do outro (por mim)... de facto, tendem estas duas tensões para um mesmo fim, há até aquilo que parece ser uma espécie de sintonia perfeita, uma compreensão plena... mas, na verdade, trata-se de um amor e um egoísmo. Uma felicidade e uma infelicidade, na ordem inversa à das aparências.
Há cada vez mais gente sedenta de ser feliz, julgam até tratar-se de um direito seu – resultante de um dever dos outros... acham que se é feliz a receber... e, assim, buscam em todas as fontes – e todas as fontes lhe parecem pouco... definham de tanto desejo, sem se darem conta que, afinal, ser feliz começa no dar... no talento divino de ser dom na vida de outra pessoa.
Ninguém se ama a si mesmo. É preciso que nos abandonemos para que nos possamos encontrar. É para o espaço entre o que sou e o que melhor posso ser que devo ir. Potenciando todos e cada um dos meus talentos. Sendo... sempre no melhor sentido, naquele que vai de mim para o outro.
Quando se estabelecem parcerias com contabilidade organizada, nas quais se regista cada gesto, onde tudo não passa de uma espécie de máquina de equilíbrios e jogos de cedências... aí, não há amor, a exigência não é parte do amor – é a essência do egoísmo.
O amor é natural, não ao ser humano, mas ao ser divino. É pelo amor, no entanto, que o homem se faz imagem e semelhança de Deus.
Muitos são os que não conseguem imaginar que alguém ame quem lhe quer mal. Mas a maldade não se combate com a maldade... e é quem escolhe o mal que mais precisa do amor para se salvar.
O amor não existe entre os seres humanos, no sentido de os atrair mutuamente, brota de dentro de quem o escolhe, e acolhe, de forma livre e consciente como sentido para a sua vida, levando essa pessoa ao encontro de outra, ao melhor de si, ao melhor da outra. Mas o propósito é o outro, a felicidade do outro... nunca a própria.
Pelo amor aproximamo-nos da perfeição, o caminho começa onde a imaginação ocupa ainda os espaços vazios que a realidade não preencheu... a pouco e pouco aprende-se que só o amor nos torna dignos dele mesmo, e que é preciso sermos capazes de nos libertarmos a nós próprios, das amarras dos nossos narcisismos, das garras das nossas cobardias, para que cheguemos a ser quem podemos (e devemos) ser.
O amor une – o homem a Deus. Quebra os muros das incompreensões e suplanta as montanhas da solidão. É uma vontade criadora, bondade pura, generosidade de quem ousa sonhar os sonhos de outrem... num caminho sempre solitário, por onde se sofre e se é feliz a cada passo. Sem condições, exigências ou promessas.
Quando o amor é verdadeiro perdura, ainda que sem qualquer estímulo para continuar...
O amor não exige nada, mas espera tudo!
José Luís Nunes Martins
jornal i,
14 dezembro 2013
http://www.ionline.pt/iopiniao/desinteresse-amor
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